quinta-feira, maio 25, 2006

 

Bem-vindo a casa


No fundo, nunca daqui saíste.

quarta-feira, maio 24, 2006

 

O Engenheiro, a Razão e a Emoção


Vou já tirar isto do caminho, para não voltar a falar no assunto até que a ocasião o torne inevitável.

Nunca simpatizei particularmente com o Fernando Santos. Não sou adepto daquele tipo de personalidade, não tenho particular apreço pela postura (muito especialmente a sisudez) e devo dizer que me induz, acima de tudo, uma sensação de aborrecimento. Sempre me pareceu (há que dizê-lo com frontalidade – como diria o Baptista Bastos) uma espécie de compêndio de tudo aquilo que me aborrece na portugalidade (a normalidade, o cinzentismo, a tristeza, o facto de parecer que anda sempre chateado com tudo e com todos, mas de uma forma sisuda – sim, porque há quem ande permanentemente chateado, mas tenha piada no exercício desse seu direito de indignação). Não tem nenhuma característica que o torne distinto. Tem um ar chato e não me parece que possua sentido de humor (apesar de ter experiência de circo e palhaços, dado que esteve no Sportem).
A única qualidade que lhe reconhecia era o benfiquismo. Dir-se-á que seria o suficiente para lhe reconhecer capacidade de redenção. Mas parecia-me um benfiquismo acanhado, talvez por força das restrições da actividade profissional quanto à plena demonstração dessa condição. Ainda assim, esse benfiquismo trouxe-lhe acusações e dissabores nos clubes pequenos que representou, como o FC Porco e a Agremiação de Queques de Camisolas Engraçadas. Nessas alturas, quando – ao serviço desses clubes mais pequenos - era atacado pelo seu benfiquismo, aí sim, tinha o meu apoio e simpatia (nós, benfiquistas, temos de olhar pelos nossos).

Tinha o Fernando Santos – uma personagem sisuda e cinzenta – na sua apresentação como treinador do Glorioso a oportunidade de mobilizar as hostes benfiquistas e de capitalizar a única efectiva vantagem competitiva que possui – o seu benfiquismo – em seu proveito, ganhando margem de manobra e simpatia. Convenhamos, o capital que tinha forçosamente de rentabilizar junto dos adeptos da Águia não era o seu passado futebolístico ou o seu currículo, manchado pelo convívio com o Porco da Costa ou os queques de Alvalade. O que tinha de explorar, a sua verdadeira arma - o que lhe poderia permitir, ainda assim, ter o benefício da dúvida junto da alma colectiva benfiquista - era exactamente o seu abençoado (para ele) benfiquismo (esse estado de alma superior do desenvolvimento humano).
Pois bem. Então o que fez o nosso Engenheiro? Passou a conferência de imprensa em absoluto estado de euforia, com um sorriso juvenil de orelha a orelha? Foi indisfarçável o seu contentamento por atingir o sonho de uma vida, foi afável e trocou comentários jocosos com os jornalistas? Piscou o olho ao mar de gente de coração vermelho?

Não. Esteve lá com o seu ar fechado do costume, e quando indagado sobre se este constituía um desafio especial respondeu, com o discurso controlado, que ‘era um desafio como os outros’, que tinha de ‘separar a emoção da razão’, que ‘havia que trabalhar de forma racional’.
Ó homem, atrevo-me a dizer que você não percebeu nada. Que, na verdade, não percebe exactamente o que é que lhe está a acontecer.
O Benfica é inexplicável, é transcendente, é – mais do que tudo e acima do que quer que seja – emoção. É um sentimento que nos enche a alma e que é difícil de verbalizar. Quantos jogos já foram ganhos por força do contágio dos jogadores por essa imensa chama que vem das bancadas?
Caro Engenheiro, estando no Benfica, o que tem mais é de capitalizar essa emoção, domá-la, e colocá-la ao serviço da equipa. Qual é o primeiro passo para fazer isto? Chamar a gigantesca alma colectiva vermelha, congregá-la, ganhar-lhe o afecto, moralizá-la, potenciá-la, fidelizá-la e canalizá-la para dentro do campo.
Trabalhar no Glorioso sem o fazer é desaproveitar o maior activo deste clube. A melhor e maior massa adepta do mundo.

O que me assusta não é tanto a incapacidade técnica (que não me parece o caso), mas a sua absoluta incapacidade de mobilização do universo benfiquista, de inflamação da grandeza deste singular modo de vida. O Benfica, na plena ignição do inferno que é a exaltação massificada de corações vermelhos, é imparável, é sobrenatural. É uma força da Natureza, é uma das maravilhas do Mundo, é algo que não se consegue explicar por mais eloquente que se seja. É algo que nos transcende.
Nas últimas épocas, vi renascida a Fénix vermelha, a força do gigante – adormecido, dormente, mas nunca (jamais) derrotado. A mobilização dos milhões e milhões de benfiquistas na caminhada para o título do ano passado e a ressurreição, na sua plenitude, do Inferno da Luz são disso exemplos de particular evidência.
O Benfica é tudo isto.
Não perceber isto é não perceber nada.

E pronto. Esta é a minha opinião. Tiro já isto do caminho e começa-se do zero. A partir daqui a hora é de união, e o Fernando Santos é o meu treinador. Espero, sinceramente, que esta aparente inabilidade de lidar com as massas e com o gigantesco mar vermelho seja apenas um lapso, um resultado paradoxal da emoção de finalmente estar à frente do Glorioso (na medida em que – temendo ser demasiado emotivo, tenha sido controlado demais). Posso estar errado, e o homem rebentar de emoção por dentro, mas não o mostrar cá para fora. Quero acreditar que sim, mas não deixa de ser pouco avisado não criar empatia (que não existe, por agora) com o mar de gente que é o Benfica. Que o consiga e que tenha o maior sucesso deste mundo (é com satisfação que tenho visto, nos últimos dias, uma significativa melhoria na gestão do seu discurso, o que é bom sinal).

Lá estarei na Luz – como sempre – para o ajudar. Não serei certamente um dos que o assobiarão (não só porque não sei assobiar, mas porque quando lá estou é para contribuir para a chama imensa).

Viva o BENFICA

This page is powered by Blogger. Isn't yours?